Quando era adolescente, a minha mãe comprou-me um romance de cordel.
Era o romance de cordel perfeito - tinha uma heroína deslumbrante que era também irreverente, corajosa e apaixonada (ah, rica, claro) (e adoptada, como de rigor).
Todos os homens com quem se cruzava se apaixonavam instantaneamente por ela, dando lugar a vários sobressaltos picantes de grande qualidade.
Chamava-se “Julia Crèvecoeur - A Luta Contra o Destino” e era afinal uma série de quatro volumes, que a minha mãe me comprou igualmente, um após o outro, tendo intuído a importância de ler romances de cordel para maiores de dezoito antes dos dezoito.
Ao longo dos quatro livros da série, Julia apaixona-se, é traída, redescobre o amor, zanga-se, perdoa, volta a amar.
Enfim, um dramalhão.
Lembrei-me hoje da Julia Crèvecoeur porque a Linda Weiss falou sobre releituras1 e me recordou de uma prática da minha adolescência que me ajudou durante anos: o livro de chorar2.
De vez em quando, quando me sentia com as emoções embrulhadas e a precisar de ventil, voltava a Julia Crèvecoeur, salvo erro ao segundo volume, e limpava a alma chorando o que fosse preciso.
Hoje, olho para trás e invejo à Rita Maria adolescente esta capacidade de reconhecer que, às vezes, mesmo que aquilo que estamos a viver não nos faça chorar de imediato, por ser demasiado confuso ou angustiante, as lágrimas nos dão muitas vezes clareza, se as deixarmos correr.
Nunca mais tive um “livro de chorar” e não sei onde foram parar os meus exemplares muito relidos da tetralogia Crèvecoeur.
Mas, depois de uma semana difícil, fiquei cheia de vontade de ir resgatar a minha amiga Julia a um dos vendedores do OLX que a têm à venda e de lavar a alma, com tudo a que tenho direito: clichês, cociguinhas e o nariz a escorrer.
Mais gente a meter água:
Este texto foi escrito no âmbito de um coletivo de escrita que junta algumas das minhas pessoas favoritas da internet a trabalhar gratuitamente sobre o mesmo tema todas as semanas:
A Curva
A Gata Christie
Dois Dedos de Conversa
Gralha dixit
O blog azul turquesa
Panados e Arroz de Tomate
Quinta da Cruz de Pedra
Um dos exemplos dela é Anne of Green Gables, a nossa Ana dos Cabelos Ruivos dos desenhos animados, um livro que adoro e que nunca sairá da minha lista de preferências pessoal, por mais anos que passem e que também reli muitas vezes.
Também havia dois filmes que via para o mesmo efeito, mas tanto na tristeza como no desejo, a palavra escrita sempre me moveu mais.
Eu foi o Paula da Isabel Allende, chorei baba e ranho no comboio. A minha mãe também me comprou uma coleção inteira de uma história semelhante a essa (parece ser a mesma editora e ilustração) mas não se chamava Júlia (e nunca li..).
Pássaros Feridos! Tenho de reler os Pássaros Feridos.