vizinhos
cinco histórias rápidas ligadas entre si por relações de vizinhança, da Idanha a Arcos de Valdevez
Crianças no espaço público
Toda a minha infância tive amigos-vizinhos, crianças próximas com quem brincava, na rua ou em casa umas das outras. Gostava tanto, um dia, de ainda voltar a ver crianças na rua, crianças a ocupar o espaço público!
Tenho os mesmos receios pela sua segurança que todos os outros pais, mas não sei se o mundo estã tão mais perigoso assim.Nomes que são o mesmo nome
O meu primeiro amigo-vizinho chamava-se Marco Filipe, e vivia na Idanha. Mas na verdade só me lembro bem do segundo, o Gonçalo, que era meu vizinho em Arcos de Valdevez.
Por falar em Gonçalo, uma teoria em teste: secretamente, Gonçalo e Rodrigo são o mesmo nome. Tal como Filipa e Patrícia. Compreendo que à primeira vista duvidem de mim, mas falem com uma pessoa com um desses nomes e perguntem-lhe o que lhe chamam quando se enganam no seu nome e depois venham-me contar.Suspensão provisória da hierarquia
O Gonçalo tinha mais dois anos que eu, mas isso não interessava, salvo quando nos cruzávamos com o Tiago, que tinha mais dois anos que ele, altura em que ele me tratava de forma diferente e eu ficava triste.
Ainda não tinha percebido que as relações com os amigos-vizinhos tinham regras próprias, as divisões de género, de idade ou de hierarquia social eram menos rígidas, mas que isso nem sempre se mantinha ao alargar o círculo e que às vezes, quando se juntavam outras pessoas, o nosso amigo de todos os dias nos tratava como quase desconhecidas (ou pior).Amigos fora do sítio
Mais tarde, quando morava em Almada, já dominava melhor esta distinção. Sabia, por exemplo, que apesar de alguns amigos da rua andarem na mesma escola que eu, mas não nos dávamos na escola como nos dávamos no bairro. Nalguns casos, isso era injusto, da parte deles ou da minha, mas hoje parece-me natural.Às vezes noto um efeito semelhante ao encontrar amigos fora do sítio, por exemplo, amigos do trabalho na rua - somos pessoas íntimas, mas ficamos ali uns minutos no passeio a fazer conversa de circunstância. Se formos tomar um café, por exemplo, a certa altura reeencontramo-nos na nossa relação, após uns minutos de desorientação.
(uma das teorias sobre separar o trabalho e a vida profissional mais bizarras que conheço é a de não ter amigos no trabalho - sempre fiz amigos no trabalho e tenho sérias dificuldades em imaginar o oposto sem um cocktail combinado de antidepressivos)
A vizinhança como esconderijo
O Gonçalo morava dois prédios a seguir a nós, no prédio que do meio morava uma amiga da minha avó que tinha o marido escondido em casa. De acordo com a minha avó, ele era procurado pela polícia por ter passado cheques carecas. Uma vez, quando lá fui fazer um recado, teria 8 ou 9 anos, deu-me chocolates. Da vez seguinte, um guarda-jóias muito feio. E da terceira, beijou-me.
A minha avó concordou que eu não tinha de lá voltar, mas acho que não contou ao meu avô nem falou com a vizinha. Eu também só contei aos meus pais muitos anos mais tarde.Hoje, lembro-me daquele homem, escondido no sítio mais flagrante possível e com o conhecimento de toda a vizinhança, e penso se estaria mesmo escondido da polícia por passar cheques sem provimento ou se teria sido a amiga a mentir à minha avó (pouco provável) ou a minha avó a mentir-me a mim (mais provável).
Relações de vizinhança
Este texto foi escrito no âmbito de um projeto que junta algumas das minhas pessoas favoritas da internet a escrever sobre o mesmo tema todas as semanas.
Deixo-vos os links para cada página e depois, mal possa, venho cá juntar o link para cada texto:
A Curva
A Gata Christie
Dois Dedos de Conversa
Gralha dixit
O blog azul turquesa
Panados e Arroz de Tomate
Quinta da Cruz de Pedra