Quando perdi uma gravidez, há alguns anos*, as partilhas de outras mulheres que tinham passado pelo mesmo foram uma espécie de tábua de salvação.
(*podem ler sobre isso aqui, mas não recomendo se forem impressionáveis, se estiverem no início de uma gravidez ou se sofrerem, como eu, de compulsões pós-editoriais)
A certa altura uma delas, que teve como eu outro filho depois desse episódio, contou-me que, ao olhar para essa criança, pensava por vezes que se aquilo não lhe tivesse acontecido, nunca a teria conhecido.
Hoje, olho para a minha Maria, maravilhosa desde a ponta do nariz até aos dedos dos pés e esperta e fofa como só ela, e penso muitas vezes nessa frase. As crianças têm este truque, depois de as conhecermos, a vida parece impossível sem elas, não é?
Nesses momentos, apesar de ter feito um compromisso comigo mesma para evitar a todo o custo o pombalismo emocional e as fugas em frente, o que sinto é isso mesmo, o coração lavado.
Pelo amor, pela sorte e por estes beijinhos matinais de quem acorda feliz.
O que há numa imagem
A imagem acima é realmente um coração lavado - mais especificamente, um coração-fantasma, feito a partir de um coração de porco lavado com um detergente especial, de forma a remover todas as células vivas e deixar só o invólucro. A ideia é que se possa depois reconstruir o resto, enchê-lo, por assim dizer, a partir de células criadas pelas nossas próprias células. Aparentemente, as primeiras experiências com ratazanas correram bem.
Outros corações lavados
Este texto foi escrito no âmbito de um projeto que junta algumas das minhas pessoas favoritas da internet a escrever sobre o mesmo tema todas as semanas. Esta semana, escrevemos sobre corações lavados. Deixo-vos os links para cada página e depois, ao final do dia, venho cá juntar o link para cada texto:
A Curva
A Gata Christie
Dois Dedos de Conversa
Gralha dixit
O blog azul turquesa
Panados e Arroz de Tomate
Há um livro chamado “You're the Only One I've Told: The Stories Behind Abortion” que tem tanta variedade de experiências e contextos. Claro, é dos Estados Unidos e isso faz com que muita coisa seja diferente, mas trás muita dimensão à perda, que parece tão solitária no primeiro momento. Também passei por uma, interrupção médica às 22 semanas, é diferente, mas perda não se pede em escala.
Que bonito, Rita 🩷